Kabul

Kabul é um espetáculo sobre a guerra vista através da intimidade de dois casais que refletem o martírio de uma nação traumatizada por vinte anos de violência e entregue à tirania dos fundamentalistas. Quatro rostos da guerra, quatro retratos de um Afeganistão visto de dentro das casas, por detrás das cortinas. Para além das fronteiras geográficas ou culturais, o que está em foco é o homem diante da violência de sua época. Segunda parte da Trilogia da Guerra, Kabul é uma criação inspirada em diversas fontes literárias, mas o ponto de partida foi uma imagem real: a de uma mulher coberta com uma burca azul, sendo executada publicamente no estádio de Cabul, em novembro de 1999. Essa imagem, feita a partir de um celular, correu o mundo e revelou um fato tão cruel quanto distante. Decidimos então aproximar. Quem poderia ser a mulher por debaixo daquela burca? Qual o seu rosto? Qual a sua história? Levantar o véu... O que contamos em Kabul poderia ser a história daquela mulher. Kabul estreou em 2009, recebeu o Prêmio APTR na categoria especial pela música composta por Beto Lemos. O espetáculo participou do Brasilian Season no Edinburgh Fringe Festival na Escócia em 2013 e no ano seguinte foi convidado a abrir o Edinburgh Fringe Showcase Festival na China, uma mostra do que foi considerado “o melhor e mais inovador” do Festival de Edimburgo. O Amok Teatro realizou duas turnês de Kabul na China, apresentado em diversas cidades com um sucesso absoluto de crítica e público.

"Sempre teremos nossos sonhos para reinventarmos o mundo que nos foi confiscado.”

Kabul - Amok Teatro





GALERIA




FICHA TÉCNICA

Direção, texto e concepção Ana Teixeira e Stephane Brodt.
Elenco
- Maryam Fabianna de Mello e Souza | Sandra Alencar
- Tariq Stephane Brodt
- Zunaira Kely Brito | Vanessa Dias
- Madji Marcus Pina | Gustavo Damasceno
Música Beto Lemos (criação) | Rudá Brauns
Iluminação Renato Machado
Figurino Stephane Brodt
Cenário Ana Teixeira
Projeto gráfico Paulo Lima
Costureira Dora Pinheiro
Produção Amok Teatro e Galharufa Produções/Erick Ferraz
Instrumentos santour, tombak, saz kumbuz, daf, kamantchê




IMPRENSA




TEXTOS


TRILOGIA DA GUERRA por Barbara Heliodora

Desde seu primeiro trabalho no Rio de Janeiro, Ana Teixeira e Stephane Brod têm mostrado, repetidamente, que o comedimento e a disciplina jamais deixam de formar a solida base sobre a qual constroem seus espetáculos; sobre ela, uma consciência clara do valor de cada uma das linguagens cênicas os tem levado a fazer uma série de positivas contribuições para o progresso do teatro brasileiro, sempre produtos de longa reflexão e detalhado preparo.

Os três espetáculos que compõem a “Trilogia da Guerra’” deixaram forte marca, e se destacam no panorama carioca, pela seriedade e a perseverança com que Teixeira e Brodt têm se esforçado para expressar em legítima manifestação cultural brasileira, o produto de suas formações européias, sempre buscando encenações simples, austeras, que usam os valores básicos do teatro para suas encenações.

A guerra, toda e qualquer guerra, tem sido tema de incontáveis obras dramáticas, de teatro ou cinema, tantas vezes exploradas pelo simples impacto que mortos, feridos e batalhas podem ter; mas no caso da “Trilogia de Guerra” do Teatro Amok, o grande mérito é a habilidade com que  tudo o que é fácil e óbvio foi abandonado, e com que foram repudiados  o patriotismo e a ideologia,  que com tanta facilidade servem para a propaganda e as exaltações . 

“Dragão”, “Kabul” e “Histórias de Famílias”, ao enveredar pelo duro caminho daqueles que sofrem a guerra, dos que não a buscam ou querem, mas são por ela vitimados, pisam em terreno difícil, delicado, e por depoimentos ou ações investigam o sofrimento humano, falam de perdas, muito além das materiais, de raízes, de membros de família que se esfacelam, de amigos que as circunstâncias tornam inimigos.

De todas essas tragédias o Teatro Amok tem falado de forma aguda, penetrante, sem um único momento de exagero ou apelação, com uma economia que torna marcas, gestos, tons mais significativos por serem poucos, exigindo do ator uma interpretação comedida, mesmo que seja, na verdade, apaixonada. 

Tudo isso, é claro, é a expressão de uma visão específica de teatro, na qual texto e ator, em um palco, não têm limites para o que podem transmitir, usando a própria imaginação para alcançar a do espectador, e fazer se realizar o milagre teatral. 

Espetáculos do nível que têm tido os do Teatro  Amok  não acontecem não acontecem por acaso; são o resultado de um trabalho dedicado e consciente, de uma paixão por atingir aquele momento extraordinário, quase miraculoso, que Ana Teixeira e Stephane Brodt acreditam que uma implacável dedicação pode criar. 

Barbara Heliodora

 

TRILOGIA DA GUERRA por Ana Texeira

Trilogia da Guerra é uma trajetória que tem suas raízes no Ecum - Encontro Mundial das Artes Cênicas – um fórum internacional que reuniu em 2006, no Brasil, artistas, pesquisadores e profissionais em torno de uma reflexão sobre O Teatro em Tempos de Guerra. 

Qual é o papel do teatro diante do sofrimento e da violência? Como o teatro responde aos desafios e questionamentos colocados pelo mundo em guerra?
Artistas vindos de diferentes partes do mundo compartilharam suas experiências. Diferentes histórias, culturas e trabalhos apontaram para um teatro que pode testemunhar, agir solidariamente e se insurgir contra brutalidade. 

Dessas experiências, o encontro com os atores iranianos do Siah Bâzi, Saadi Afshar e Shadi Zadeh, repercutiu sobre a trajetória do Amok. O Siah Bâzi é uma forma de teatro cômico que improvisa cenas repletas de alusões à atualidade e à política. Em 2003, o governo iraniano decidiu, sem aviso prévio, fechar o Teatro Nasr – o mais antigo de Teerã. Os atores do Siah Bâziforam expulsos do lugar onde trabalhavam e ficaram desamparados, impossibilitados de exercerem sua arte. O Siah Bâzi incomodava e o público iraniano viu seu teatro ser silenciado.

A intensidade desse encontro nos impulsionou a mergulhar num projeto sobre o tema da guerra que pudesse refletir nosso desejo de afirmar o teatro como um lugar de convívio para pensar o mundo em que vivemos. Desejo também de investigar formas de dialogar com o real e procurar novas linguagens que permitam uma leitura do nosso tempo a partir de questões humanas universais. 

Assim, iniciamos um percurso que resultou na criação de três espetáculos: O Dragão (2008), Kabul (2009) e Histórias de Família (2012). Nessa trilogia apresentamos três espetáculos independentes, três retratos da guerra e três diferentes experiências de linguagem cênica. 

Nesse projeto, não pensamos na guerra como um fenômeno que atinge apenas alguns, ou um determinado povo. Nosso objetivo foi abordar esse tema a partir da alteridade. Um desejo de aproximação, de pensar a questão da violência a partir da experiência do outro buscando uma identidade humana e sem fronteiras. Para além dos limites geográficos, históricos ou culturais, o que colocamos em foco é o homem diante da violência de sua época.

Acreditamos que esse olhar em direção ao estrangeiro responde a questões levantadas pela globalização em que migração, minorias, individualismo, cultura de consumo e tentativas de hegemonia são realidades efetivas. Nossa intenção foi compartilhar nossa perplexidade diante do monstro da guerra, traduzindo isso cenicamente, em atos, sons e movimentos.

Abordamos problemas que consideramos fundamentais na história contemporânea, acreditando que o teatro pode ser um lugar de discussão desses problemas. O que pode ser dito através do discurso cênico não pode ser dito através de nenhum outro discurso (científico, político ou jornalístico) e, por isso mesmo, ele pode interferir sobre a percepção que temos do real. Nesse percurso, espetáculos, debates e encontros com o público foram indissociáveis.

Trilogia da Guerra é um projeto sobre a memória, sobre um teatro que persiste em não esquecer. Um teatro que dialoga com nossa época, com seus impasses, seus desejos, seus sofrimentos e suas esperanças.
Ana Teixeira











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